O preço mais amargo do chimarrão há pouco mais de um ano fez os gaúchos mudarem seus hábitos na hora de apreciar a bebida-símbolo do Rio Grande do Sul. O tradicional topete de erva-mate praticamente desapareceu das cuias, que também diminuíram de tamanho.
A alteração no comportamento reduziu em 20% o consumo no Estado em 2014, segundo o Sindicato das Indústrias de Erva-Mate do Estado (Sindimate), justamente quando os produtores dobraram o rendimento por hectare ao investir em adubação e manejo de ervais praticamente abandonados.
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A escassez de matéria-prima em 2013, reflexo do baixo valor pago aos produtores por muitos anos e dos poucos investimentos na cultura, fez o preço da erva-mate aumentar em mais de 200% para os consumidores. No campo, os agricultores viram a arroba da folha (equivalente a 15 quilos) passar de R$ 8 para R$ 32 naquele período. Com o quilo do produto custando mais de R$ 15 no varejo, os consumidores adaptaram seus hábitos.
– O gaúcho não deixou de tomar chimarrão, só reduziu a quantidade de erva na cuia – diz o presidente da Associação Gaúcha dos Supermercados (Agas), Antonio Longo, confirmando a redução no uso do produto no último ano.
Cuias menores e erva na altura da borda fizeram cair em mais de 1,5 milhão de quilos o consumo mensal no Estado – estimado em 8 milhões de quilos pelo Sindimate. No Brasil, o consumo mensal é de cerca de 15 milhões de quilos de erva-mate.
A baixa refletiu diretamente no preço pago ao produtor, que caiu para menos de R$ 15 por arroba nos últimos meses. Essa redução, porém, não chegou na mesma proporção aos supermercados, diz a Agas. A explicação, segundo o presidente do Sindimate, Gilberto Heck, é a defasagem gerada pela alta de 400% da matéria-prima, que não foi repassada integralmente ao consumidor. O quilo da erva varia hoje entre R$ 7 e R$ 15, conforme o Instituto Brasileiro da Erva-Mate (Ibramate).
– Tivemos um desequilíbrio momentâneo, e o cenário se estabilizou. Oferta e consumo estão equiparados, com preços justos para o mercado – analisa Gilberto Heck, presidente do Sindimate.
Porongo menor
No Rancho Gaúcho, banca 16 do Mercado Público de Porto Alegre, as vendas de erva-mate tiveram redução de 40% em 2014.
– Recentemente, o preço baixou alguns centavos, mas não o suficiente para a retomada no consumo – diz Roberson Groff, gerente da banca, que percebeu aumento nas vendas de cuias menores.
Enquanto o preço da erva não cair, a tendência é de que a procura por cuias pequenas persista. Produtor de 10 hectares de porongo em Santa Maria, Edemilson Guimarães Xavier, 35 anos, cultivou a planta em carreiras mais próximas e controlou o adubo nesta safra para garantir a produção de plantas menores.
– O mercado não quer mais cuias graúdas, com capacidade para 300 gramas de erva. As de 100 gramas são as que mais se vende hoje – confirma Xavier, morador do distrito de Arroio do Só, um dos principais polos de produção de porongo e cuias no Estado.
Plantados em setembro do ano passado, os porongos começarão a ser colhidos em março para, então, serem transformados em cuias. Se depender da baixa de preço e dos consumidores, tendem a ser cada vez menores.
Adubação e manejo permitem dobrar o rendimento de ervais
Deixados de lado por anos, devido ao baixo retorno da cultura, os ervais gaúchos foram recuperados recentemente com adubação, manejo do solo e podas. Os investimentos em tecnologia fizeram com que a produtividade média do Estado saltasse de 400 arrobas por hectare, em 2013, para mais de 800 arrobas por hectare no ano passado, conforme dados da Emater.
Com 20 hectares plantados em Ilópolis, no Vale do Taquari, o produtor Cleber Gabiatti, 32 anos, começou a investir nos ervais em 2013, quando o preço da arroba chegou a quadruplicar. Desde então, passou a corrigir o solo com calcário, usar adubação verde (nabo, aveia e ervilhaca) e aperfeiçoar o sistema de poda. O resultado: a produtividade média saltou de mil arrobas para 1,8 mil arrobas por hectare.
– Procuramos assistência técnica, para melhorar a nossa produção, tanto em qualidade quanto em rendimento – conta Gabiatti, que trabalha ao lado da mulher Viviane Durigon e dos pais Dário e Neiva Gabiatti.